Já
faz um bom tempo que minha pretensiosa, perturbada e questionadora mente pensa
a respeito do mais complexo dos sentimentos. Depois de concluir que “não vai
haver amor nesse mundo nunca mais” (dá-lhe Marceleza), passei a tentar compreender
primeiro o que é o amor, para, finalmente, buscar compreender porque ele não
existe mais. (É preciso deixar claro que o amor aqui discutido é o que
supostamente ocorre entre casais de namorados, etc. Excluí-se, então,
obviamente, o que acontece de pai para filho, de neto para avó, entre amigos,
etc.)
Assistindo
ao filme “Jules et Jim” (Jules e Jim – Uma mulher para dois, François Truffaut,
França, 1962), encontrei um verdadeiro exemplo de amor, no sentido mais puro,
verdadeiro e sincero da palavra; Jules, interpretado de forma simples, porém
intensa, pelo ator Oskar Werner. Vale lembrar que esse amor ocorre apenas na
ficção, o que não tira dele o título de “amor verdadeiro”
O filme:
a belíssima e cativante Catherine (Jeanne Moreau) casa-se com Jules, que traz
seu amigo de infância, Jim, para morar com ele e com sua esposa. Recém casados,
já fazem um filho, que nasce enquanto a dupla de amigos está lutando na guerra.
A mulher cria a filha sozinha, enquanto troca cartas apaixonadas com seu amado.
Quando voltam do combate, a esposa passa a distanciar-se cada vez mais de
Jules, confidenciando a Jim que seu marido voltara muito mudado da guerra.
Jules, na verdade, venerava cada vez mais sua esposa. Jim e Catherine ficam
cada vez mais próximos e íntimos, até que ela resolve trocar de par. Enquanto
Jules brinca com a filha, sua esposa transa com seu grande amigo, na mesma
casa.
A
partir daqui, o filme deixa de ser simplesmente um roteiro bem feito filmado
por um diretor competente, para entrar para a história como um dos maiores
filmes já produzidos. A genialidade e grandiosidade de um, à época, jovem
cineasta. Truffaut nos tira do lugar comum e comprova a frase de apresentação
do DVD: “O melhor filme já feito sobre o amor”. Podemos pensar que Jules vai
matar os dois traidores (não chamaremos mais assim), que ele vai embora
revoltado ou que vai brigar e infernizar a vida dos dois. Nada disso ocorre.
Ele segue amando, admirando e venerando sua deusa, além de respeitar a decisão
dela. Isso é amor. Em uma conversa franca, Jim acusa Jules de tratar Catherine
como uma rainha. A resposta vem com um sorriso puro, através de uma voz
tranquila: “mas ela é uma rainha”.
Se
observarmos com um olhar desatento, podemos considerar a obra uma “putaria” ou
até mesmo a classificarmos como um simples triângulo amoroso. Mas não é assim,
milhões de vezes, NÃO.
Quem
ama de verdade não precisa provar, pode viver tranquilo, desde que seu(sua)
amado(a) esteja feliz e em paz. O Jules amava, de fato. Aceitou ser trocado,
pois percebeu que, no momento, Catherine achou que ele não era a melhor opção
para ela. Além disso, serviu de amigo e conselheiro, quando Jim fugiu sem
deixar notícias. Ele teve chance de transar com ela na ausência do amigo, mas
não o fez, visto que sempre respeitou, a cima de tudo, seu verdadeiro amor.
Quem
ama, cuida, protege, suporta, dá carinho, faz rir. E só. Não questiona, não
prende, não expõe, não mente, não oculta. E digo mais: o amor verdadeiro é
traído, mas aceita. Enquanto o lugar comum chama de corno, eu chamo de amor
inabalável, simplesmente amor. Se for diferente disso, não é amor.
Se
eu sinto ciúmes, o sentimento ridículo é meu e eu tenho que dar um jeito nele.
A pessoa que está comigo não tem culpa nenhuma e nem precisa ficar sabendo. Ter
ciúmes deveria deixar a pessoa envergonhada.
Após
compreender o que é amor, a mais nova conclusão é que ele não passa de um
horizonte inalcançável, um delírio daqueles que só a mente humana mais doentia
pode acreditar.
O fato de o verdadeiro amor ser inalcançável para a
mesquinhez humana não redime os outros sentimentos menores, elevando-os ao
status de amor. Assista “Jules
e Jim” e cuide-se, por favor, para não cair no lugar comum.
"Não vai haver amor nesse mundo nunca mais."